sábado, 3 de janeiro de 2009

O coração do homem-bomba

Dez minutos de vida. O pouco que sobrou de seu coração pulsa freneticamente como dois martelos em ação, um em cada lado da cabeça. Fecha os olhos e tenta, pela última vez, se convencer de que a sua vida tem uma razão: aquele momento. Mas, também pela última vez, lembra de outra vida que podia ter tido, mas é outra, não essa, já foi, tarde demais, embora teria sido bom de outro jeito. Um gramado verde e extenso, quase infinito, um chalé de madeira e um jardim florido, muito florido - era ficcionado por flores, embora não pusesse isso à vista devido à vergonha -, quatro crianças, produtos seus, correndo e divertindo-se com um, dois ou quem sabe três cachorros. Teria sido legal, diferente, fantástico. Suspira.
Mas, o coração do homem-bomba não bate sempre por sentir vontade, e sim pra sentir saudade. Saudade da vida, de bater, martelar, viver. É um coração disciplinado e racional, racista, inconsequente** e burro, fútil, mesquinho, treinado. Sim, treinado, pois haja treino pra fazer um coração desamar, dessentir, "desviver". É vida de gado, boi marcado, e um  sentido fascinante: nada.
Volta a abrir os olhos, vê todos aqueles civis e pensa quantos daqueles deixarão de ser e existir por causa dele mesmo. Imagina aquela senhora caída com as pernas mutiladas, a outra criança dilaçerada e o olhos daquele cego que atravessa as ruas, fechados para sempre. Mas sim, está decidido, terá de ir enfrente. Não desistiria agora. Ou não!? Fugir?! Como?! Olha e pensa nos comparsas, também decididos, lembra de uma floresta que tem a poucos metros, correria até lá e se esconderia até o anoitecer e, após isso, fugiria para outro país para recomeçar. Parecia uma boa saída.
Os comparsas o chamam, ele olha para os lados, começa a correr muito, como nunca, em rumo à floresta mas lá no fundo pensando no seu jardim. Os comparsas correm também, indignados com a atitude do miserável traidor barato e infeliz, mas, lá no fundo, agradecendo por ter uma desculpa para o plano ter dado errado, quem sabe assim sobreviveriam! Correm uns duzentos metros, a floresta não chega, nosso protagonista volta à civilização para tentar se camuflar no meio da multidão e quem sabe escapar. O plano falha e os comparsas estão a poucos metros dele. Um deles estica o braço, agarra o colarinho da camisa já suada do traidor, este vira para trás para tentar se soltar, esbarra naquela senhora - aquela, dos pés mutilados, lembra? - e cai...  bum.




**tremas não existem mais, não é culpa minha! 

Um comentário:

  1. Coração do homem-bomba faz tum-tum
    Até o dia em que ele fizer bum
    O coração do homem-bomba faz tum-tum
    Até o dia em que ele fizer bum!

    ResponderExcluir