quinta-feira, 29 de julho de 2010

diário de uma viagem [4

É lindo isso. Essa sensação de falta de tempo quando penso em tudo que posso criar. Ouço minhas músicas, leio meus textos, meus projetos de livros, minhas ideias de possíveis filmes e chego a ficar com a respiração acelerada. A arte se espreguiça por dentro de mim e se estica até não dar mais. Ela quer levantar, quer acordar, quer viver. Deve ser, decerto, ser isso o que me move. É agora, dentro de um avião de plástico, mais pra lá que pra cá, com nuvens espalhadas em pequenos blocos e uma terra verde escuro com sombras escuras destas mesmas nuvens que cobrem minha vista, que essa necessidade de arte toma conta. Lá no fundo mora uma ideia de mudar as coisas ao redor. Olho pra mim, pra minha capacidade de criação, pra capacidade das pessoas ao meu redor, e não consigo acreditar que somos piores que muita gente que tá por aí. É se reunir, tomar cerveja, conversar, tocar um violão e a vida vai saindo... Na última dessas a música que saía espontaneamente cantava: “Segunda-feira, pra juventude, quem disse que hoje é dia de se organizar? Segunda-feira, de madrugada, anteontem essa hora eu tava no bar...”. Éramos três, e lembrávamos de como a bossa-nove surgiu, de um grupo de amigos que se encontravam para beber e tocar, compartilhar músicas próprias, inventar um novo jeito de tocar... Sonhamos, sonhamos e a vontade de arte que a juventude nos doa batia latente no risonho coração embriagado. “Tudo se resume a isso, meu caro...” É isso o que todas essas coisas me sussurram muitas vezes... porém não o suficiente pra que se torne ainda verdade em mim. “Eu queria ser artista pra poder fazer o que eu quiser”, “Não posso com o fogo do meu querer, não posso não”, “E é tanta coisa no mundo pra se conhecer, que eu não sei se na minha eu vou ter tempo de viver”, “Até quem não veio pra ver, verá”, “Sinto saudade do que já não é verdade”, “O pensamento nos dá oportunidade de ir e voltar”...

segunda-feira, 26 de julho de 2010

diário de uma viagem - carta ao tom 47 [3

Na nostalgia da madrugada, mal-iluminada, após um bom filme visto. E é justo agora, a essa altura da vida, do tempo, da hora, que tudo que é meu me vem pelas mãos. Ou tudo que eu gostaria que fosse meu. Um bom filme, uma boa música, uma linda recordação de algo que já não é - mais - verdade. Aquele tempo, ah aquele tempo... Calzone ou buffet? A moreninha ou a clarinha? Tocamos essa ou aquela música no próximo ensaio? Vídeos engraçados e espontâneos feitos pelo celular, nenhum sonho de ser famoso mas um simples deleite por puro prazer, por puro hormônio correndo em todas as veias, por puro "deixa o vento bater na cara". O que é mais longe? Daqui praí ou de Floripa praí? Não sei, cara... Parece que a vida resolveu separar - com ajuda tua, claro. Não vou dizer que não há rancor, e não verdade nem há, aliás o que existe é uma puta raiva pra falar a verdade... Porra! A gente tá tudo aqui... Por que ficar aí? Por causa desse amor, né? Mulher só fode mesmo, digo, só nos fode, pra não confundir. Elas nos fodem, cara... Nos fodem e nos fodem. Por que é do que a gente mais precisa no final das contas. Mas não sinto raiva delas, sinto muito amor - e tesão. Espero que ela cuide bem de ti, o que está parecendo quando vejo tuas caras de babaca nas fotos... Mas é aquele babaca de boa. Tipo um desses maconheiros pelas ruas, saca? É bom te ver feliz, velho. Mas nem pra te dar um abraço essa felicidade adianta... É uma pena. Te amo. Abraço muito forte... E aquelas risadas... - sinto-as ecoando pelas paredes no escuro...

domingo, 18 de julho de 2010

diarios de uma viagem [2]

Eh engracado como tudo sempre se resume a uma pessoa. Tudo mesmo. Todos meus pensamentos, meus sonhos, meus delirios, referem-se sempre, no final das contas, a uma pessoa. Me assusta? Talvez, um pouco... essa imensuravel duvida da minha certeza de que essa pessoa morara ate o fim dos dias nos meus pensamentos, nos meus sonhos, nos meus delirios. Quero tudo o que eu mereco, quero tudo o que ela merece, quero que nossos sonhos caibam nas nossas vidas e que a vida nao seja melindrosa com quem ama demais. Cabe ainda, nesse mundo, gentes que amem demais? Ou os que nao amam continuarao a corroer os romanticos? Os romanticos sao tao fracos assim? O que falta para esses mesmos sacarem das calcas de couro dois revolveres e atirarem no peito daqueles que nao amam? Falta coragem? Falta rancor, desamor, desesperanca. Fico, por enquanto, atras de um colete a prova de balas.

sábado, 17 de julho de 2010

diário de viagem [1]

De novo me encontro na estrada. As ruas mostram placas de uma outra língua, de uma outra visão de mundo. Capitalista? Pragmática?
Tudo bem, concordo, mas como visitante devo reconhecer o serviço do Estado em cada pedaço bem cuidado de estrada, em cada árvore de cada bairro, em cada... Enfim.
No rádio do carro uma música canta "I've got the world" e ainda diz mais: "Life is beautiful"... De fato? De fato! Vejo colinas pelo horizonte que nunca vi,
vejo planícies de uma mata seca, desértica, que me faz pensar sobre o tamanho desse mundo, dessa natureza, desse deus - e não de mim ou do meu pau.
Por falar em mim, pelo reflexo dessa tela de computador móvel (essa criação nojenta) enxergo um rosto de um cara - um homem, uma criança, um mentiroso,
um sincero e todas as contradições que o ser alguém remetem - de barba por fazer, testando até que ponto consegue sair de si e desvencilhar-se dessa coisa selvagem
que é chamada vaidade - ao mesmo tempo que veste roupas recentemente compradas: São tantas as contradições... A música muda, agora quem canta é João Gilberto.
Ah... que saudade da minha língua. Não essa mordida, queimada pelo café... a brasilleira, porra!
As palavras são lindas, os fonemas perfeitos, a complexidade de uma visão de mundo que nos permite pensar, pois a linguagem permite, limita e cria oportunidades
para o pensamento - embora essa relação não seja unilateral.
Isso tudo me traz, um pouquinho, de volta para o meu país, para o meu lugar. O tempo nem é tanto, mas eu sou daqueles que chega uma hora que o saco enche e até transborda de ficar tanto num lugar diferente do meu.
Mas esse momento ainda não chegou. Ainda tenho muito para ver e para delirar nos pensamentos sobre a minha vida e sobre as vidas que amo e que se encontram bem longe de mim.

método luquinista

Quero que as palavras saiam uma a uma involuntariamente ou inconscientemente e se juntem formando uma frase inesperada.
Não uma frase que me sirva de doutrina, não necessariamente uma rima ou, por momento, um mandamento:
uma frase estética isenta de ética, dialética, mas lindamente esquelética, frenética, epilética, roléica, pastéica,
jeitética, servélica, querénica, vivértica, mengrélica! Prostrando gruminhosamente uma yorse sefininda, e jorgrenhando komenó salim trequismo infenilente.
Jovim! Jovim!

brain-storming [1]

Hoje de manhã eu acreditei ser quem eu não sou.
E parti e toquei a correria achando que a mentira nunca me atingiria.
Por que atingir um mendigo como eu? Quem sou eu se não um porco gordo que combina as palavras uma atrás da outra como fila de elefantes?
Que ser idiota faria isso? Eu... Eu acredito haver mais que fotos e gorjetas frescas e pitorescas como a calabresa que almoço numa taberna alienada.
Hoje, combino as palavras uma atrás da outra sem ter tempo de respirar. Espalho-me uma a uma para que possa, ao fim, exercitar.
Meu esporte é o de fazer aquilo que não combina, aquilo que desrima, aquilo que destoa e que tinge uma broa de pão de velho. Broa, broa, boa... Voa, mãe, voa!
Vai ter que dizer que nada de gula de mentalizar umas fulas ideias é gaguejar. Quem gagueja pestaneja! Amarela cor de sol que me doura: corroa minhas couraças antes que meu ombro se encolha!